Profº. Me. Zé Muniz - É Caiçara de Guaraqueçaba, também de Paranaguá. Pesquisador e Historiador. Integra a Associação Cultural Canutilho Temperado. Contato: <muniznativofilho@yahoo.com.br>.
Profº. Leonardo Matias das Dores de Oliveira - É Pescador Artesanal Caiçara; Coord. do Movimento dos Pescadores e das Pescadoras Artesanais do Litoral do Paraná (MOPEAR); Coord. do Fórum de Povos e Comunidades Tradicionais de Guaraqueçaba.
ARARAPIRA AINDA PULSA!
ARARAPIRA SEMPRE PULSOU!
Nosso amor à Terrinha, carinhosamente como chamamos o lugar onde nascemos, é de uma imensidão, incrível e inexplicável, singular entre outros ricos aspectos característicos de nossa Cultura Caiçara. Alguns observadores tentaram escrever sobre a relação de nossa cultura com o nosso território, mas, significa dizer que é pertencimento, de pertencer-conhecimento-sentimento e, portanto, estranhos à estes, podem até riscar belas palavras sobre, mas esta integração não lhes faz jus; não possui os vínculos afetivos que o Caiçara têm com o seu Território.
De momentos de estranhamento ao que era considerado exótico, ao menos no olhar do colonizador/explorador, ao atual encantamento com as belezas natural e cultural, Nossas Comunidades Caiçaras, historicamente, assistiram a “invasão de uma mar e gente estranha” descaracterizando-a, com grandes mudanças após a introdução do rádio e da televisão, por exemplo, também da restritiva legislação ambiental e, o contato com o mundo urbano e globalizado apresentando grande oferta de alimentos industrializados e processados, drogas e outras tantas violências, cercas e muros, empreendimentos imobiliários de luxo, enfim, outros costumes, outras crenças, contrapondo-se àqueles tradicionais Modos de Vida Caiçara. Cenários geradores de Pressão-Repressão-Êxodo.
Um caso que merece a atenção contemporaneamente, é em relação à quinhentista Vila de Ararapira – São José da Marinha, testemunha de páginas de Nossa História, anciã que vivenciou o apogeu e o declínio, mas ainda Vive e que, para muito além destes aspectos históricos é exemplo vivo do Amor à Terrinha nutrido pelos seus filhos, guardiões de histórias e memórias do passado, mas que constroem presentemente seu futuro em uma complexa relação com àquele Território.
A História reservou para Ela páginas lamentáveis de descaso e abandono por parte do Estado, da história quinhentista que é negligenciada, de sumiço de seu patrimônio, pois a imagem do Padroeiro São José de Ararapira fora roubada, do barranco que engole a Vila e seus pontos de memória, do êxodo, da expulsão, da resistência é o que segue...
Constantemente, em tempos mais recentes, a Vila de Ararapira têm sido alvo de pejorativo adjetivo, cunhado por quem não a conhece em sua riqueza e esplendor, portanto, alguém estranho às tradições vivas do povo, daquele lugar, de Ararapira, dos Ararapirenses, dos Caiçaras. É preciso estar atento aos fatos! Fora noticiado em rede nacional não há muito tempo atrás reportagem mentirosa e sensacionalista sobre a Vila de Ararapira, com absurdos sobre a História, onde na sequência os moradores se manifestaram através de Carta Aberta online, onde exigiram respeito e que sua História seja contada, mas de forma verídica. Há até, acreditem, pesquisa científica, com aval de Universidade Federal que propõe um roteiro turístico visando explorar a Vila Fantasma...
Em uma era de valores capitalistas dominantes, a vantagem econômica se eleva e molda padrões culturais, inclusive violando os princípios inerentes à Cultura Caiçara, encontrada ainda resistindo em muitas comunidades em Nosso Território.
Os costumes de compadrio e de vizinhança, são atacados e pressionados por um predatório turismo que penetra com valores e crenças externas aos costumes comunitários, além de infinitos produtos e destes, consequentes rejeitos, profundas transformações.
Quando o impacto sentido é também cultural, a falta de educação do “visitante” é evidente através de seus atos e dos rastros que deixa, de desrespeito, conforme recente denúncia (julho de 2025) em que moradores da Vila de Ararapira reclamam de ações inapropriadas de “visitantes/turistas” ao urinarem em qualquer lugar, ao fotografarem moradias e pessoas como se realmente fossem fantasmas, da quebra do sagrado silêncio das Águas e das Matas, da velocidade de suas embarcações nos estreitos canais, deixando sempre suas pegadas de desrespeito. Isso precisa ser banido!
E vale lembrar que neste caso da Vila de Ararapira, a Comunidade está no que se delimita hoje como Parna Superagui, uma Unidade de Conservação, de proteção integral, onde há seríssimas restrições quanto à presença humana no local, como seria, portanto, pensarmos num local com estrutura para receber um turismo desordenado, ou mesmo a possibilidade da construção de um banheiro público para atendimento turístico... Seria permitido? E não nos iludamos com projetos que prometem “melhorias para todos”. Todos quem?
Estas BRs do Mar nos guiarão ao desenvolvimento ou apenas ao crescimento? São os valores culturais que estão a mercê de novas e grandes transformações. E vale muito lembrar o quão modificaram-se as estruturas culturais de comunidades que já nas décadas de 1960 e seguintes, começaram a receber levas cada vez maiores de um turismo desordenado, sendo hoje, importante visualizarmos e percebermos, o que realmente restou ao Caiçara, de seu Território, de sua Cultura. Algumas hoje, irreconhecíveis, com sistemas comunitários e seus modos de vida modificados, com a expropriação, com a exploração de mão-de-obra local, com uma evangelização restritiva, com acúmulo de lixo, dentre outros; ao mesmo tempo, ainda encontramos Comunidades que preservam e resistem à abrupta entrada de “outros valores”, pequenas vilas, que ainda não possuem estruturas para receber um turismo desenfreado e ao mesmo tempo necessitam de capacitação, orientação, fomento.
Ararapira Não É Uma Vila Fantasma.
Ararapira É Viva! Ararapira pulsa!
Sim! Com maior ou menor demografia, o Amor é evidente dos Ararapirenses à sua Terrinha. Hoje eles estão em Iguape e Cananéia, no litoral paulista, Guaraqueçaba, Paranaguá, no paranaense, em outros cantos, mas também em sua Terrinha, pois jamais perderam seu vínculo afetivo, sua ligação umbilical com Ararapira; antigamente muitos, depois pouco menos, de uns tempo pra cá alguns, recentemente com outros, pisando no Solo Sagrado, visitando sua residência, com reformas e pinturas, limpando as trilhas e caminhos, bebendo da Água da Fonte, planejando reformas na Igreja, carpindo o Cemitério, ondem descansam nossos antepassados, celebrando o Padroeiro São José. Ararapira é Viva! Ararapira Pulsa!
Saber da imagem de abandono e de “vila fantasma” é triste, um tanto contraditório para quem conhece aquela História e para os que compartilham esta Cultura. Este pacote turístico de ignorância não interessa aos Povos e Comunidades Tradicionais, é preciso denunciar.
O Estado não pode continuar negligenciando Ararapira. Nossos Povos e Comunidades precisam ser respeitados, seja através do Dec. 6.040/2007 que instituiu a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6040.htm>, seja através da Política Nacional de Turismo de Base Comunitária, que debate legislação específica no Paraná <https://mandatogoura.com.br/wp- content/uploads/2021/04/Proj_138_Dep_MabelCantoeoutros.pdf>, seja através de Protocolos de Consulta e Protocolos de Visita, ainda, é claro, seja através da ética, dos bons costumes e do respeito de agentes de turismo, de setores público e privados, de jornalistas, de pesquisadores, das Associações de Moradores, enfim, do comprometimento de todos por um Turismo de Base Comunitária onde prevaleça o respeito aos Povos e Comunidades Tradicionais.
É preciso estarmos atentos. É preciso expor e denunciar as violações.
Viva Ararapira,
seu filhos (ararapirenses) e suas Histórias.
Viva os Caiçaras, os Povos Tradicionais do Brasil!
Salve São José de Ararapira.
Para saber um pouco mais:
Monografia: Vila de Ararapira – 2008 – FAFIPAR-Paranaguá. <https://drive.google.com/file/d/0B3Ue7WCPmb5GOF9YTVlMbnk5MEE/view?usp=sharing&resourcekey=0-8e_pUACqtFImhOjdjQMiLg>.
Documentário: Canal do Varadouro – 2018 (GPR Vídeos)
<https://www.youtube.com/watch?v=YTWkM-fJ178 >.
Página no Facebook: Comunidade de Ararapira
< https://www.facebook.com/people/Comunidade-de-Ararapira/61577115043388/>.
Página no Facebook: MOPEAR Movimento dos Pescadores e das Pescadoras Artesanais do Litoral do Paraná – Postagem: Falta de Respeito.