Que estamos na Quaresma todo bom
caiçara sabe e aquele bom fandangueiro já, logo depois do carnaval,
desencordoou sua viola e a pendurou, dentro de um saco, com a boca virada pra
parede, guardando este tempo do cristianismo...
Aqueles que ousavam tocar viola, ou
mesmo fazer Fandango durante este tempo, sempre recebiam alguma punição por
desafiar sua tradição, como a família do velho Chico Santos <http://informativo-nossopixirum.blogspot.com.br/2011/01/lenda-guaraquecabana-parte-ii-tangara-o.html>.
Neste ano de 2016, a
Sexta-Feira-Grande (Sexta-Feira-Santa), durante a Quaresma, será também o dia 25
de março, outro dia que pela tradição caiçara deve-se resguardar de certas
atividades, entre elas fazer Fandango! A encarnação e a crucificação, no mesmo
dia!
Este dia, 25 de março (9 meses antes de 25 de dezembro, nascimento de Jesus), como
acreditam os cristão, portanto também enraizada na cultura caiçara, foi o dia
da Anunciação do Anjo Gabriel a Nossa Senhora, e Maria, a partir de então
recebeu Jesus em seu ventre, por isso uma data muito respeitada pelos antigo,
nas palavras de Faustino Mendonça (In Memoriam): “um dia de descanso, onde não
se pode trabalhar”.
Certo caçador, mesmo contrariando os
pedidos da mãe, que lhe clamava para que não fosse caçar naquele dia santo, aprontou
sua espingarda, carregou alguns cartuchos com pólvora, chamou seu cachorro e
foram pro mato... Ainda deixou recado pela vizinhança que voltando com a caça,
noutro dia ia ter Fandango na vila.
Em
determinada altura, já mata adentro, o cachorro acuou uma caça, deixando seu
dono alegre quando este viu se tratar de um veado, e dos grandes, pensando logo que o Fandango seria dos bons...
Imediatamente mirou e disparou
contra o animal, acertando ‘de cheio’, mas notou que o veado não caiu;
Disparou novamente, acertando-o, mas o animal a cada novo disparo
certeiro, cambaleava, parava olhando para o caçador, e logo corria mata
adentro, como se nada o atingisse e a perseguição adentrando mata continuava.
Como já estava escurecendo, o caçador resolver disparar seu último tiro, era o 25º cartucho e novamente certeiro, mas nada do bicho cair...
Já
escuro e sem munição, retornou o caçador pra casa, sem caça, pensando no que ia
servir no Fandango que ia fazer...
Chegou
em casa já noite avançada, cansado, suado e sem a caça, ouvindo ainda sua mãe ‘ralhar’,
pois aquele não era dia de caçar.
Noutro
dia, a vizinhança chegando pro Fandango, não se incomodaram muito por não ter
caça servida, pois apenas o café com arroz e farinha já foi o suficiente para aquela
noite de Fandango, animada ao som das violas, rabeca, adufe e o batido dos
tamancos.
De repente
na porta, apareceu um desconhecido, alto, bem aparentado, de chapéu na mão, sendo logo convidado a entrar e se
divertir... Este sentindo-se a vontade, dançou dondom com todas as damas presentes
e em seguida pediu a viola pra tocar também.
Alguns
riram, pois duvidavam que aquele desconhecido soubesse tocar Fandango, mas como
dançava muito bem foi dado a ele uma viola e sentou-se ao lado do
dono-da-casa, o caçador, para tocarem juntos...
Viola
afinada, o dono-da-casa, caçador, também mestre violeiro, perguntou se o
desconhecido sabia alguma moda, pra cantarem juntos e surpreendeu-se quando o
desconhecido puxou a seguinte moda:
“25 de março / No mato muito
corri
Levei 25 tiros / Não morri
estou aqui.
Em 25 de março / O cachorro
me fez correr
Eu aqui neste fandango / Não
pretendo amanhecer”.
Instantaneamente,
após cantar o verso, ouviu-se um estouro no salão e o violeiro desconhecido
desapareceu, restando no ar um tremendo mal cheiro que fez todos correrem pra
fora... assustados, sem saberem o que aconteceu...
O dono-da-casa
então contou a todos a história do veado que perseguira no dia 25 de março e
dos 25 tiros que acertou e o bicho não morreu, não restando dúvida, em se
tratar, aquele visitante, do ‘coisa ruim’...
Ninguém
quis saber mais de dançar, acabou o Fandango e o povo foi indo pra casa, mas o
caçador ainda ficou a noite toda acordada, sem conseguir dormir, pois a cada
cochilada que dava ouvia o cachorro latir, como se estivesse acuando alguma
caça e assim foi durante o ano todo, quando dormia, a certa altura da noite acordava assustado, suando, ouvindo seu cachorro
latir, lembrava então de toda aquela história que passara...
Assim foi até o dia 25 de março do
outro ano, quando resolveu ficar em casa, em respeito a data.
Nasceu
assim na tradição caiçara o costume de não caçar e não fazer Fandango no dia 25 de março...
*******
saber mais sobre algumas tradições caiçaras da Quaresma
O Amargoso e as tradições da Quaresma
<http://informativo-nossopixirum.blogspot.com.br/2009/04/amargoso-e-as-tradicoes-da-quaresma.html>.
Bela estória da tradição! Parabéns Zé
ResponderExcluirGrande Zé Muniz...as publicações no Pixirum sempre são sensacionais.....Parabéns
ResponderExcluirMassa essa história Zé!
ResponderExcluir